Por: Vanessa Wohnrath
CANNES A atriz brasileira Alice Braga (“Elysium”) vive a mocinha em perigo de um curioso western argentino, que traz o mexicano Gael García Bernal (“No”) como o icônico forasteiro sem nome – mas também sem chapéu de cowboy e até mesmo camisa. Trata-se de “El Ardor”, passado numa floresta argentina, que teve première fora de competição no Festival de Cannes.
Segundo o diretor argentino Pablo Fendrik (“O Assaltante”), a princípio a história não tinha gênero. Foi ao longo do desenvolvimento do roteiro que ele percebeu que a trama evocava a mitologia do western.
Inicialmente, era a história de um homem que se vê obrigado a viver num local inóspito, e que ali terminava se ambientando”, revelou, durante a entrevista coletiva de Cannes. “Mas, conforme escrevia o roteiro, comecei a perceber que a história se parecia muito com os conflitos narrados nos westerns, e que ela tinha muitas similaridades com eventos ocorridos nos anos 1800, tempo de colonos e colonização, não só do Velho Oeste, mas de muitos outros territórios, e que, por isso, o filme poderia ser contado com a estrutura de western”.
O filme acompanha um forasteiro (Bernal) que emerge da floresta para testemunhar um ataque de mercenários (liderados por Claudio Tolcachir, de “O Passado”) a uma fazenda de tabaco, que resulta na morte do dono da propriedade e no sequestro de sua filha (Braga). Chocado com os eventos, que evocam o que aconteceu no passado com sua família, ele passa a perseguir o bando pela floresta para tentar resgatar a moça.
A produção mescla elementos clássicos do western, apresentando os mercenários como foras-da-lei e a floresta argentina como as pradarias americanas. Além disso, a própria trama, embora passada nos dias de hoje, explora conflitos enraizados no século 19, mostrando que algumas regiões da América do Sul continuam tão selvagens quanto o Velho Oeste americano. A crítica internacional não se impressionou, taxando a produção de trash bem fotografado, mas cunhou um novo termo para batizar o resultado: machete western, a versão latina do spaghetti western.
O conflito básico é o mesmo de todo western tradicional. Mas com diferenças geográficas significativas. “‘El Ardor’ é uma história de vingança em um contexto que me interessa muito: o desmatamento e a expulsão violenta de pessoas de suas terras”, declarou Fendrik, que achou importante fazer da floresta um personagem do longa. “Eu me deparei com histórias de violência contadas pelos habitantes da região, fiquei com essa influência muito presente.”
As filmagens aconteceram na região das Missões (ou Misiones, como chamam os argentinos), às margens do Rio Paraná e a duas horas da Foz do Iguaçu. “Foram seis semanas de filmagem bem intensas, no meio do mato, onde o celular não pegava e onde eu tive que aprender a conviver com aranhas”, contou Alice Braga, em conversas com a imprensa durante a première.
Mas aranhas não foram os piores bichos que o elenco encontrou. Eles também encararam uma onça-pintada, inserida na trama para representar os perigos da floresta. “Usamos uma onça de verdade, que levamos muito tempo para encontrar, pois precisávamos manter Gael, Alice e toda a equipe seguros o suficiente. Afinal, estamos lidando com um animal selvagem, que não é domesticado nem treinado”, explicou Fendrik.
Por sua vez, Bernal procurou expor o comportamento de uma pessoa em terreno inóspito. “Com o meu personagem, quis mostrar uma pessoa que só tem suas mãos para sobreviver, mergulhada um ambiente no qual está na base da cadeia alimentar. Para mim, era muito importante poder mostrar como o ser humano pode viver em um ambiente no qual não controla”, declarou o ator.
Além de estrelar o filme, o mexicano assina a produção do longa por meio de sua produtora, criada em conjunto com o amigo e ator Diego Luna (“Elysium”). Curiosamente, Alice e Diego já foram namorados, e durante esse período ela se tornou amiga de Gael. “Os dois fazem um grande trabalho com a produtora Canana, realizando filmes em toda a América Latina”, apontou a brasileira.
A amizade, porém, se provou um problema na hora das filmagens mais íntimas. “Nas cenas de paixão, quando a gente tinha que olhar fundo no olho do outro, acabávamos estragando as filmagens com um ataque de riso, porque a situação era surreal para nós que somos muito amigos”, ela contou.
Alice não é a única brasileira do elenco, que ainda inclui Chico Díaz (“O Sol do Meio Dia”). O Brasil, por sinal, também participa da produção, após o roteiro ter sido um dos vencedores do Edital de Coprodução Brasil-Argentina de 2012, recebendo apoio financeiro da Agência Nacional do Cinema (ANCINE). Por conta disso, mesmo sendo um filme de aventura, seu lançamento nacional deve acontecer em algum festival de relevo no segundo semestre, como o Festival do Rio ou de Brasília.
FONTE: PIPOCA MODERNA